segunda-feira, setembro 27, 2004

A Perda de um Medo

Estudo realizado com ressonância magnética mostra regiões cerebrais activas neste processo!

Cena de Psicose, filme de 1960 de
Alfred Hitchcock (foto: reprodução)


Pesquisadores da Universidade de Nova York descobriram como funciona o cérebro humano quando perdemos o medo de algo. Mais do que um mero esquecimento desse medo, o que ocorre é uma aquisição de conhecimento: o cérebro aprende o não-medo.
O estudo revelou pela primeira vez detalhes das regiões cerebrais mais activas neste processo. Duas áreas estão envolvidas: uma pequena estrutura chamada amígdala, que constitui a chave para aprender o medo e o seu 'esquecimento', e uma região ligada a ela, o córtex pré-frontal, provavelmente essencial para memorizar a perda do medo.
Os pesquisadores submeteram voluntários a uma experiência muito simples: eles observavam num monitor, quadrados amarelos e azuis em diferentes sequências. Em algumas aparições da figura azul, os participantes recebiam um choque aplicado por um eléctrodo.
"Os voluntários aprenderam que essa cor significava um choque em potencial, enquanto o amarelo indicava que a descarga eléctrica não ocorreria", explica o neurocientista brasileiro Mauricio Delgado, pesquisador da Universidade de Nova York. Radicado nos Estados Unidos há 17 anos, Delgado é um dos quatro autores do estudo, publicado em 16 de setembro na revista Neuron.
Antes do teste, foi permitido aos voluntários estabelecer o nível da descarga eléctrica que iriam receber para que fosse apenas desconfortável e não doloroso. Delgado explica que o medo dos quadrados azuis, associado à concretização da experiência indesejada -- o choque recebido em algumas aparições daquela figura -- activava no cérebro dos participantes a área da amígdala.
No mesmo dia em que o medo havia sido adquirido, os voluntários foram submetidos a uma nova sessão de testes -- desta vez, para avaliar como reagiam à extinção do medo. O mesmo exame foi aplicado, mas quando o quadrado azul aparecia, não havia descarga eléctrica. Uma nova sessão de testes sem qualquer choque foi realizada no dia seguinte.
O cérebro dos voluntários foi monitorado durante as sessões por um aparelho de ressonância magnética. O aumento de actividade na amígdala já era esperado pelos pesquisadores, devido ao resultado de estudos anteriores. O que surpreendeu a equipa foi o padrão de activação dessa região nos casos em que a ausência do choque era associada ao quadrado. "A amígdala codificou informações sobre o evento e alterou a resposta quando o novo dado se encontrou disponível e, assim, considerou o seu esquecimento como uma aquisição de conhecimento", afirmam os pesquisadores no artigo.


Segundo os cientistas, a actividade no córtex pré-frontal sugere que ele está associado à assimilação da extinção do medo. "Entender como o medo é adquirido é um passo importante para desenvolver tratamentos para fobias relacionadas a desordens como ansiedade e stress pós-traumático", ressalva Delgado. "No entanto, compreender como os medos são reduzidos pode ser ainda mais precioso."
Os pesquisadores destacam que os resultados podem servir de base para aperfeiçoar um modelo do mecanismo de apreensão do medo e o seu esquecimento, que permitirá avaliar se esse processo funciona da mesma forma em diferentes espécies.

3 comentários:

David Nogueira disse...

Caro visitante, por certo entenderá como está descrito no texto, que este foi um estudo científico realizado por quatro pesquisadores da Universidade de Nova York (entre eles um neurocientista) e devidamente publicado numa revista científica identificada no texto. Por aí talvez se possa creditar a este texto/estudo algum rigor científico. Como compreenderá um estudo científico obedece a variadissimas regras, que têm de garantir a validade e fiabilidade deste. Não sendo este estudo da minha autoria, aquilo que depreendo do mesmo é que foram identificadas as áreas cerebrais envolvidas na realização das tarefas, existindo uma aprendizagem associada às cores, uma espécie de condicionamento clássico (se desconhecer este conceito/terminologia, procure estudos de Pavlov). Ao ler outros comentários seus, não deixei de notar a sua alusão ao autor António Damásio, um dos maiores e mais importantes neurocientistas do mundo. Por certo saberá que Damásio é um dos grandes defensores de que todo o comportamento humano tem uma base psicofisiologica (fundamental por sinal), sejam emoções, pensamentos, aprendizagens, etc. Baseando-me nisso e ao considerar este estudo pertinente, achei por bem facultar a possibilidade aos nossos leitores de o conhecerem. Muito obrigado pelo seu comentário e agradecido pelo seu bom gosto ao ler o nosso blog.
Os melhores cumprimentos

David Nogueira disse...
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David Nogueira disse...

Caro leitor, não sei se percebi bem o seu ponto, uma vez que termina o seu comentario dizendo que qualquer ligação entre o pensamento e a base fisiológica é subjectivo, segundo Damásio, mas antes refere que os elementos psíquicos alteram as redes neuronais! Pois bem, se me operacionalizar "elementos psíquicos" talvez eu perceba melhor a sua ideia. Relativamente ao ultimo livro do Damásio, eu não estou familiarizado com este, por isso não me vou pronunciar acerca da relação bi-direccional que falou, entre a "consciência" e a "base" fisiológica, influenciando-se mutuamente. Outro aspecto que também não ficou muito claro para mim, foi ter enquadrado a experiência no pos-positivismo, uma vez que a experiência foi realizada por neurocientistas e não por psicólogos, não entendendo assim a falta de coerência a que se refere. Mais uma vez muito obrigado pelo seu comentário, ficando bastante agradado pela possibilidade de dialogarmos. É de salutar! Cumprimentos